sábado, 9 de janeiro de 2010
Eu ,o llivro Sou muito especial.Minha tecnologia é insuperável.Funciono sem pilhas , bateria , pilhas ou circuitos eletrônicos.Sou útil até mesmo onde não há energia elétrica.E posso ser usado mesmo por uma criança:basta abrir-me. Nunca falho , não necessito de manual de instruções , nem de técnicos que me consertem.Dispenso oficinas e ferramentas. Sou imune a vírus , embora figure no cardápio das traças.Se algo em mim o leitor não entende , há um similar que explica todos os meus vocábulos. Através de mim as pessoas viajam sem sair do lugar.Não é fantástico? Basta abrir-me e posso leva-las a Roma dos Césares ou à Índia dos Brâmanes , aos estúdios de Hollywood ou ao Egito dos faraós , ao modo como as baleias cuidam de seus filhos e aos paradoxos dos buracos negros. Sou feito de papiro , pergaminho , papel , plástico e , hoje existo até como matéria virtual.Domino todos os ramos do conhecimento humano.E , ao contrário dos seres humanmos , jamais esqueço.Se me consultam , elucido dúvidas , respondo indagações ,estimulo a reflexão , desperto emoções e idéias
Posso ensinar qualquer idioma: tupi ,grego , chinês ou Russo.Até línguas mortas , como o latim.Introduzo as pessoas na meditação zen-budista e nos segredos da culinária mineira , nas partículas subatômicas e na história do automóvel , nas maravilhas dos jardins suspensos da babilônia e nos hábitos dos escorpiões.para utilizar-me a pessoa escolhe o lugar mais confortável:cama , sofá da sala , tamborete da cozinha , degrau da escada ou banco do ônibus.Trago a ela os poemas de Fernando Pessoa e os salmos da Bíblia ; as noções de como operar um monitor de TV e a biografia de John Lennon as viagens de marco Pólo e os cálculos da propulsão das naves espaciais.
Trabalho em silêncio e nunca incomodo ninguém , pois jamais insisto.É o meu leitor que se cansa e, neste caso ,pode fechar-me e continuar a leitura horas ou dias depois.Não fujo , não saio do lugar , não bandono quem cuida de mim.Fico ali à espera , em cima de uma mesa ou enfiado numa prateleira , sem alterar o meu humor.Exceto quando sou alvo da cobiça de pessoas sem escrúpulos , que me roubam de meus legítimos donos. Revelo a quem me procura , o que for de seu interesse:como cuidar do jardim ou detalhes da guerra do Paraguai; a incrível paixão de Romeu e Julieta ou a atribulada vida amorosa de Elvis Presley;os segredos de fabricação de um bom vinho ou as mil e uma interpretações de As mil e uma noites. Pode estar comigo e , ao mesmo tempo , ouvir música ou viajar de trem , navio ou avião , sem necessidade de pagar a minha passagem.Sou transportável , manipulável e até descartável.Mas costumo enganar a quem confia nas aparências:nem sempre o m,eu rosto revela o conteúdo.
Sem mim a humanidade teria perdido a memória.E possivelmente , não ficaria sabendo que Deus se revelou a ela.Sou portador de epifanias e sonhos , tragédias e esperanças , dores e utopias.E sou também uma obra de arte , dependendo de como os meus autores tecem e bordam as letras que preenchem as minhas páginas. Livre e lido , sou livro. Frei Betto é escritor , autor de A obra do artista-uma visão holística do Universo(Ática), entre outros livros.
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