sexta-feira, 20 de março de 2015

É que esse amor a bagunçou inteira.


É que esse amor a bagunçou inteira. Jurou que viria vê-la por três vezes. E a mesa posta, a casa limpa, o vestido bordado. Agora o cheiro das flores que murcharam na chita do vestido lavado. Agora esse café frio, uma das taças intacta, o vinho pela metade. E ela contando sua coleção de esperas, crepúsculos e cartas rabiscadas em guardanapos.
Tentando se reorganizar novamente,rezava para que tudo voltasse ao seu devido lugar: onde não havia nenhum (falso) entusiasmo e nenhum desses fogos (de artifício).
É que esse amor a bagunçou inteira. E a louça suja de um prato só. E a angústia dura de um parto só. E toda a ternura, como havia lido em Drummond, toda essa ternura inútil, desaproveitada.
Ela só queria que essa dor tão familiar, lhe fosse estranha. E que alguma coisa lhe fizesse companhia, nem que fosse uma voz do outro lado que considerasse a importância que havia para ela de, pelo menos, ouvir um “adeus”.
E pedia esperançosa:
“Deus perdoa por eu ter amado, desajeitadamente, quem não me amou de jeito algum.”
Marla de Queiroz

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