Minhas posses materiais são poucas
e eu deixo tudo pra você...
Uma coleira mastigada numa das extremidades,
uma desajeitada cama de cachorro e uma vasilha
de água que se encontra rachada na borda...
Deixo pra você a metade de uma bola de borracha,
uma boneca rasgada que você vai encontrar debaixo
da geladeira, um ratinho de borracha sem apito que
está atrás do fogão e uma porção de ossos enterrados
no canteiro de rosas e sob o assoalho da minha casinha...
Além disso, eu deixo pra você a memória
que, aliás, são muitas...
Deixo pra você a memória de dois meigos e enormes
olhos marrons, de uma caudinha curta e espetada,
de um focinho molhado e de uma choradeira atrás da porta...
Deixo pra você uma mancha no tapete da sala de estar,
junto à janela, quando nas tarde de inverno eu me apropriava
daquele lugar, como se fosse meu, e me enrolava feito uma bolinha
pra pegar um pouco de sol...
Deixo pra você um tapete esfarrapado em frente de sua cadeira favorita,
o qual nunca foi consertado com o tipo de linha certo...
isto é verdade! Eu o mastiguei todinho quando tinha cinco meses de idade,
lembra?
Deixo também, só pra você, o barulho que eu fazia
ao sair correndo sobre as folhas de outono,quando
passeávamos pelo bosque.
Deixo,ainda, a lembrança de momentos pelas manhãs,
quando saíamos juntos, pela margem do riacho,e você
me dava aqueles biscoitos de baunilha...
Recordo-me de suas risadas porque eu não consegui
alcançar aquele coelho impertinente!
Deixo-lhe como herança minha devoção,a minha simpatia,
meu apoio quando as coisas não iam bem,
meus latidos quando você levantava a voz aborrecido...
e a minha frustração por você ter ralhado comigo.
Eu nunca fui à igreja e nunca escutei um sermão.
No entanto, mesmo sem haver falado sequer uma palavra,
em toda a minha vida,deixo pra você o meu exemplo
de amor, paciência e compreensão.
Sua vida tem sido mais alegre,
... porque eu estive a seu lado !
...seu cão.
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