"A gente se acostuma com quase tudo nessa vida. E cada vez mais.
Hoje em dia é preciso um ágil processo de assimilação das coisas . Ponto pra você se tudo te parece banal.
O mundo gira tão rápido , a gente pira tão rápido, descarta um punhado de coisas o tempo todo pra caber mais informações , lugares , senhas, e pessoas , dúvidas e papéis, lembranças que vão embora pra que outras tomem seu lugar.
A gente se acostuma mais por defesa do que por obrigação. Mais com coisa ruim do que qualquer outra sensação. Sim, tem gente leve no mundo. Mas eles não se relacionam com gente normal, não sempre. Acredite, gente normal surge de vez em quando, mais isso é outro assunto.
A gente se acostuma com draminha diário, o café frio, o cinzeiro sujo. Com os olhos molhados da saudade que não passa de um tempo que passou e que você talvez nem tenha vivido direito, apenas passado por ele. A gente se acostuma com a tragédia real, do jornal, em pleno dia de sol , a violência do nada , pra nada, a criança no sinal, catástrofe na sua esquina ou lá longe no Japão.
A gente morre de supetão e não se assusta com isso. Um quarto e sala no Rio custa quase 1 milhão e dizem que nem elevador tem o edifício !
A gente dorme pouco, dorme tarde, levanta correndo , nem vê mais as crianças , os amigos, os filmes , os pássaros, . A gente se acostuma com a ansiedade , essa prece moderna . Fala demais e já não sabe por que serve o silêncio.
A gente se acostuma com dias nublados, dias difíceis, dias quentes , dias que não chegam e aqueles dias cheios de angústias inexplicáveis.
A gente se acostuma com a falta de assombro, a falta de tempo.
Falta momento em que a gente pare.
Parei.
Pra que a vida me arrebata, ora, porque o pulso ainda pulsa."
Rodrigo Penna
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