sábado, 15 de janeiro de 2011

As esposinhas e o segundo antes de dormir, no espelho, tirando a maquiagem, o silêncio, sorriem amarelo: aquelas putas, aquelas, que eles não tiram da cabeça, podem até..podem até…mas quem casou fui eu!


Sentadas no sofá, sorrindo amarelo. Na rodinha em frente, os maridos, porque eles precisam disso, falam atrocidades. Deixa, vai. Deixa. Afinal, ele é uma besta na jaula. Finalmente. Na jaula. As esposinhas. Um deles pediu: promete estar sempre bem cuidada e maquiada e linda e cheirosa? Então ela está. Uma até queria ir lá na rodinha, tem uma piada melhor pra cu ou peido. Mas ela é esposinha. Imagina que cena? Pode não. Cada uma levou um prato. A que não sabe cozinhar se gaba da empregada. Porque ela não sabe cozinhar mas sabe ensinar. Elas são engenheiras, advogadas, médicas e, as mais ousadas, atendimentos de agência. Elas não vêem a hora de não ser mais nada disso. De se dedicar a pesquisar o preço do piso. Ah, as esposinhas. Ele comeu meia cidade e não casou com a mais bonita ou a mais gostosa ou a mais inteligente. Ele casou com a melhor esposinha. O outro, doido de tudo, tinha muito medo. Adivinha do quê? De mulher doida. Porque homem pode tudo. Te ligar bêbado, insistir pra comer seu rabo quando nem beijo na boca você liberou, surtar na porta do restaurante porque o carro atrasou um minuto, falar de amor no segundo encontro. Agora tente, tente, ter um segundo sequer de desequilíbrio hormonal. Espere, esposinha. Não ligue. Não queira. Não pergunte. Mulher não manda no ritmo de nada. E elas, como mortas vivas, como passivas que pagam alguma penitência para pertencer ao mundo das mulheres que conseguem casar, sorriem amarelo. Desde que o dinheiro continue entrando. Desde que no elevador as pessoas saibam que ela merece respeito, afinal, tem um macho dentro daquela casa. A esposinha não vê que ele flerta de leve, apenas pra alisar o ego do seu pau meia bomba, com todas as outras esposinhas. O outro importou do interior. Tão fofa. Tão, tão. Ce acredita que até barra de calça ela sabe fazer? Elas te olham instigando. É inveja minha o que você tem, não é? Porque eu tenho marido, certo? Porque domingo, enquanto o Faustão berra, enquanto ele dorme roncando, eu bordo almofadas. É inveja, não é? O que é? Porque você me olha? Sentadas retinhas. Ah, a mais ousada, cochicha: ele não sabe que eu tinha um casinho com um cara do trabalho antes de conhecer ele e tal. Puxa! Que ousada! As esposinhas e os jantares para os casais de amigos e as viagens com os casais de amigos. A sociedade que se junta como num suicídio em massa: os casais de amigos! As esposinhas e tudo que engolem e tudo que sufocam e tudo que não suportam. As esposinhas e o segundo antes de dormir, no espelho, tirando a maquiagem, o silêncio, sorriem amarelo: aquelas putas, aquelas, que eles não tiram da cabeça, podem até..podem até...mas quem casou fui eu!
Tati Bernardi

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