sexta-feira, 29 de outubro de 2010

SENTIMENTOS: Amor novo é diferente explode os dias, aquece a carne. Tem adrenalina. Provoca. Amor do passado tem sabor de nostalgia. Escreveu história. Ilustrou a vida. Inspira e faz delirar a mente


Tem sentimentos que não dão para serem esquecidos. Coisas que ficam na memória afetiva, que dilatam o coração e fazem com que pulse forte. O corpo revira na cama pedindo ajuda, os olhos de lágrimas escorrem sua dor. Um amor do passado que gravou sua história para sempre. Surtiu o efeito devastador na vida, pois parecia ser maior que tudo. Mesmo cambaleando, ele sempre retornava ao seu lugar. Amor tatuado. Lacrado. E, mesmo assim, escapou.
Há quem jure não mais pensar em um amor que se foi. Pode até ser, mas então não foi amor. Quem amou se doou, sentiu arrepios na alma de saudade. Amor do passado deixa registro no coração. É lá que se guardam os melhores sentimentos. Não falo aqui de coração ferido, magoado, cheinho de mágoas. Mas do que foi acariciado por outro repleto das delícias do afeto verdadeiro. Saudade de alguém dizendo "te amo", " mulher de minha vida", "linda" e outros mimos gostosos de escutar. Isso é coisa que não se esquece. Passam-se os anos e martelam as lembranças.
Amor novo é diferente: explode os dias, aquece a carne. Tem adrenalina. Provoca. Amor do passado tem sabor de nostalgia. Escreveu história. Ilustrou a vida. Inspira e faz delirar a mente. Só de lembrar aquele beijo gostoso o corpo se contrai todo. A cama quentinha treme, de tanto que se fez amor. Sentimento forte assim é para sempre. Registra a alma e deixa o perfume sem igual no espírito.
Quem ama de verdade não esquece jamais algo assim - risadas soltas, liberdade no abraço. Superações constantes. Idas e voltas. Lágrimas de tristeza ou de alegria. No duelo do amor estão envolvidas grandes emoções. Paixões. Perdão. Até o abraço da reconciliação. Um amor do passado é história de vida... sai por aí mostrando a beleza em ter sido realidade. É a vontade danada de contar detalhes, dizer o quanto se foi feliz.
Mas quando ficou mal resolvido, é mais triste do que muita coisa na vida. O corpo perde as forças. A motivação desfalece. A esperança reprime. Conheci duas pessoas que se amaram demais e preferiram se separar. Não tiveram forças em superar os medos. Era uma angústia danada dia e noite. Viviam transtornados sonhando um com o outro. Suas vidas ficaram vazias. Lembranças sobre lembranças tentavam sobreviver a cada manhã. Passaram-se anos.
Certa vez, foram a uma mesma festa. A noite estava linda, os jardins pareciam ornados de rara beleza. O céu vaidoso se encheu de estrelas. Os dois tinham ido sozinhos, por incrível que pareça, ainda não tinham parceiros.
Como se os tempos deles tivessem marcado um encontro, se dirigiram à beira do lago. Cada um na ponta do espelho de água de longe se avistaram. Não fazia frio, mas congelaram. Plantados nos chão, não conseguiam sair do lugar. Choraram. Seus corações explodiram. O passado revisitou suas peles e arrepiou a carne. Os beijos que foram trocados naquela época tão boa revigoraram e saíram dos baús empoeirados. O tremor invadiu suas mentes. Podiam sentir o toque leve e firme do outro.
Sentimentos explosivos se deram, mas era tarde demais. Um amor do passado tão profundo que não foi cuidado. Que sequer teve a oportunidade de se refazer. Lutar. Superar. A sensação do encontro foi forte demais e devagar se afastaram do tal lago. O medo de remexer no amor antigo, de sofrer a rejeição, provocou estranheza e profunda tristeza. Dali mesmo foram para casa sonhar com o que viveram. Mais uma vez disseram não para um sentimento ainda vivo dentro de suas almas. Mais uma oportunidade se foi.
É imperdoável que pessoas que se amem tanto digam não à felicidade. Que os seus rostos se virem contra as verdades das emoções plantadas em seus seres. Preferir partir com o vazio imenso preso nas costas. A bagagem pesada da desilusão.
Um amor do passado poderia ser recuperado se duas pessoas quisessem se redimir. Resolver as pendências, pelo menos se entenderem e, aí sim, darem um basta a tantas dúvidas. Mas a opção pela complexidade é cruel - característica das escolhas do ser humano. O amor é simples, só quer florescer.
Se você é uma dessas pessoas que prefere não resolver um amor, cuidado! O que fica vivo no coração ninguém consegue mandar. Mas se prefere a dúvida, o que fazer? Tomara que anos depois, quando se encontrarem à beira de um lago, consigam ver rostos de verdade refletidos... e não faces tristes repletas de solidão.
O coração é o lugar mais íntimo do ser. Nele se guardam os mistérios da vida. Cuide dele! Acenda uma luz e veja se ali está algo que precisa ser resolvido. Pendências fazem sofrer e, de sã consciência, quem quer continuar na dor?




(Beth Valentim) é psicanalista e escritora. Possui mestrado em Psicologia Social e é autora dos livros "Essa Tal Felicidade", da editora Elevação e "Mequiel - O Caçador de Sonhos", da editora Dunya

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