Aquela mancha diesel do sovaco, aquela gasolina pelo corpo. Odor concentrado, acampado nos ombros. Suor impossível de esconder, de quem está de pé no ônibus todo dia, de quem trabalhou desde manhãzinha e não trocou de roupa, de cor, de sol. Suor de engarrafamento, de janela aberta, de cabine de caminhão. Suor macabro, frio e quente, de espanto e insistência. Suor que secou e voltou a correr. De usar as mangas, raspar os botões, embaçar óculos. Suor de alardear cães de caça, própria da solidão de um foragido. Camisa empapada, calça já colando nas pernas. Suor de quem jogou futebol duas horas e ainda está pingando, com os cabelos desordeiros e a barba alerta. Qualquer mulher apressaria o chuveiro. Qualquer mulher mandaria me arrumar antes de conversar. Qualquer mulher abriria barreira com os braços: "Nem se aproxima". Qualquer mulher teria nojo, olharia de canto para não me enfrentar de frente. Qualquer mulher torceria o nariz e pegaria uma revista para fingir leitura enquanto espera. Para que me livrasse de mim, do hóspede incômodo, intruso. Que tranquilizasse primeiro a carne com sabonete e espuma, que arborizasse rapidamente o pescoço. Qualquer mulher, não a minha. Ela me enlaça quando chego. Nem me deixa explicar. Agradece que fui recebê-la assim, desajeitado, direto da rua, do compromisso. Atraída pelo meu cheiro como um animal em extinção. Aviso que vou me lavar, ela acena que não. Eu me desculpo dos modos, ela encaixa as pernas na minha cintura. Mantenho o respeito, ela confessa que gosta da brutalidade, da crueza. Tento afastá-la, ela xinga que não está nem aí. Vai me encabulando de anseios. Diz que é química. Não respira, fareja. Persegue cidades em mim. Repassa seu nariz pelo meu braço, de um lado para outro, de um lado para o outro, como quem enxágua os traços. Pede que eu tire as roupas, que venha para dentro. Agora.
Fabrício Carpinejar.
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